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sábado, 20 de outubro de 2012

CONGRESSO PREPARA ATAQUE CONTRA A PRIVACIDADE NA INTERNET


REVISTA ISTO É N° Edição: 2240

Um ataque contra a sua privacidade. Nova lei da internet, em discussão 
no congresso, coloca em risco as informações privadas dos brasileiros 
que acessam a rede

 Izabelle Torres 



A privacidade dos 71 milhões de brasileiros que navegam na internet vale muito 
dinheiro e está em risco no debate em torno das regras para o funcionamento 
da rede mundial de computadores no Brasil. O texto do marco civil da internet 
em discussão no Congresso vem atraindo um jogo de lobbies e deixa brechas à 
proteção de dados dos usuários. A nova legislação permite que as informações 
pessoais que circulam pelos sites acionados pelos internautas sejam usadas 
para alimentar o mercado de publicidade direcionada. 



Apesar de assegurar, à primeira vista, a inviolabilidade dos dados, o texto em 
tramitação agride a privacidade do usuário, como pode ser conferir numa 
leitura mais atenta da proposta. O perigo mora no artigo do projeto que 
supostamente garantiria os direitos dos internautas. Apesar de proibir o 
fornecimento a terceiros de registros de conexão e acesso, o texto abre 
exceção para casos em que o próprio usuário dá “consentimento livre, expresso
e informado” para o uso de seus dados. Isso acontece, na maioria das vezes, 
sem que a pessoa se dê conta.
Ocorre que praticamente todos os termos de adesão para a criação de contas
de e-mails ou redes sociais incluem essa autorização automática. 
O cliente não tem opção: ou concorda com os termos de uso ou simplesmente
não usa os serviços. A artimanha garante aos provedores de serviços o acesso
a dados  dos internautas. 
A invasão se dá na forma de uma aparente coincidência: o internauta comenta 
sobre um produto ou serviço na rede e logo passa a ser bombardeado por 
anúncios. 



A manobra é replicada nos cadastros de sites de compras e outros serviços 
online. Ela é mais flagrante no Google. Ali, para abrir uma conta no Gmail, o
usuário esbarra num termo de adesão escrito apenas em inglês, no qual abre
mão da privacidade. “Você concorda que o Google pode usar seus dados de
acordo com a política de privacidade”, diz um trecho do contrato. 
Na rede social Facebook não é diferente. 
Ao se cadastrar, o internauta precisa aprovar os termos do acesso, que na 
prática representam a autorização para o uso dos dados de navegação. 
“Usamos as informações que recebemos sobre você em relação aos serviços
recursos que fornecemos a você e a outros usuários, como seus amigos, 
nossos parceiros, os anunciantes que compram anúncios no site e os 
desenvolvedores que criam os jogos, aplicativos e sites que você usa”, 
informa o termo. 



Enquanto provedores de serviços como e-mail e rede social se beneficiam dos 
contratos para lhes garantir o acesso e o uso de informações dos usuários, 
provedores de conexão, como as companhias telefônicas, fecham parcerias 
milionárias com empresas especializadas em rastrear a navegação. A multinacional 
Phorm é uma dessas empresas e hoje presta serviços para a Oi e a Telefônica no 
Brasil. Sua missão é traçar o perfil dos internautas e descobrir seus interesses de 
navegação. São provedores de acesso como as duas empresas de telefonia que 
mais brigam para que o marco da internet não as deixe de fora do clube de quem 
fatura em cima da privacidade dos internautas. O argumento é que os sites de 
e-mails e redes sociais já fazem esse rastreamento, mesmo sem previsão legal. 
“É uma briga grande, mas acreditamos que o texto da forma como está fechará 
muitas brechas”, alega o relator do projeto na Câmara, deputado Alexandre Molon
(PR-RJ). “Sabemos que algumas empresas, como a Phorm, vivem dessa 
bisbilhotagem disputada pelo mercado da rede. Queremos frear esse comércio e 
impedir que a privacidade alimente os negócios. Acho que o marco é um avanço 
para isso.” O parlamentar não explica, porém, como vai garantir a privacidade dos
usuários diante dos termos de adesão que o internauta encontra pelo caminho. 
O governo tem pressa na votação do texto. Um dos que pressionam pela aprovação
ainda neste ano é o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo.


GANHAM PARA VASCULHAR
Deputado Alexandre Molon (PT-RJ) diz que
empresas vivem da bisbilhotagem

Na contramão do discurso de Molon, o especialista em direito eletrônico Renato
Opice Blum, da Fundação Getulio Vargas, diz que a aprovação do marco não vai 
garantir a privacidade, mas apenas oficializar – se não aumentar – o comércio de 
publicidade direcionada que existe atualmente. “Esse texto não muda nada, uma 
vez que a maioria dos brasileiros autoriza o uso e a divulgação dos seus dados 
sem se dar conta. O problema é que ninguém costuma ler os contratos dos serviços”,
diz. Para Blum, como a nova legislação não deve frear o comércio de informações, 
restará aos brasileiros ter cautela ao navegar na rede e, sobretudo, na hora de 
escolher os serviços que contrata. Diante da guerra de interesses, o único consenso
entre os vários atores dessa discussão é que, aprovado o texto em debate no 
Congresso, ganharão força os negócios feitos à custa da privacidade do internauta.

 

Fotos: shutterstock; Sérgio Lima/Folhapress

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