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segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O SUL, 06/10/2012

 
BEATRIZ FAGUNDES

Não neguem aos apunhalados o direito de gritar revelando ao mundo sua intensa dor. Não neguem o dever dos preteridos de lamentar sua condição de abandono. Permitam que assumindo uma nova condição - a de meio-cidadãos - reproduzamos em todas as praças e pelas ruas o sentimento de impotência que aniquila a moral dos gaúchos! Confesso que estou "velha", pois sou do tempo no qual um malfeitor armado que causasse dano a um cidadão com o torpe objetivo de roubar seus bens materiais utilizando qualquer meio era considerado pelo nosso Judiciário "um elemento que representa risco à ordem pública e à segurança dos cidadãos".

No passado, eles, os assassinos, ladrões, assaltantes e traficantes eram mandados sem dó nem piedade para os cárceres destinados àqueles que decidiram pela senda do crime. Evoluíram e eu, assim como uma parcela significativa da sociedade, não acompanhei. Hoje, libertar marginais se transformou em uma forma nova de fazer a tão sonhada "justiça social"! Está claro que todo esse introito se dá em virtude da decisão de um juiz, na capital do Estado mais politizado do Brasil, de libertar dois criminosos que atiraram para matar uma cidadã brasileira que no meio da tarde ousou transitar nas nossas ruas sitiadas, e infestadas por criminosos, na busca de seus dois cachorrinhos em uma pet shop na bucólica área nobre do centenário Parque Farroupilha.

A professora, médica e vítima ainda está na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital Moinhos de Vento, em recuperação. O seu estado de saúde inspira cuidados e não há previsão de alta. A decisão do magistrado de libertar os marginais presos em flagrante por competência e rapidez da polícia, baseado na burocrática situação de que não havia um papel do Ministério Público ou mesmo do Plantão Judiciário da Polícia Civil, pedindo a prisão preventiva dos criminosos, está difícil de metabolizar ou, mais popularmente, de engolir!

A Ajuris (Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul), em decorrência da polêmica instaurada, emitiu nota em apoio ao colega, entre outras motivações, pela que segue: "A independência judicial é uma garantia do Estado Democrático de Direito em defesa da cidadania. A função do Poder Judiciário é garantir os direitos individuais, coletivos e sociais e resolver conflitos entre cidadãos, entidades e Estado".

Eureca! Em defesa da cidadania de quem? Da vítima? Ou resultou em um salvo-conduto para os marginais? A Ajuris destacou que os "quase" assassinos, de acordo com a decisão, deverão comparecer em juízo quinzenalmente dando conta de suas atividades e recolhimento noturno obrigatório a sua residência das 22h às 6h, interpretação baseada na Lei processual penal em vigor. Que ótimo! Cabe lembrar que eles atacaram a cidadã às 17h. Podemos supor então que entre as seis horas da manhã até as vinte e duas eles poderão seguir aterrorizando os cidadãos de bem de nossa Capital? Quem fiscalizará a permanência dos acusados em suas residências durante o horário determinado?

Alguém argumentou que muitos magistrados vêm optando pela soltura de marginais presos em flagrante delito a fim de não sofrerem a dor na consciência por enviarem "pessoas" ao nosso dantesco sistema carcerário! Que meigo! Certamente se tivessem optado pela profissão de Assistentes Sociais, fariam uma grande diferença na nossa estrutura republicana. Por que então optaram pela magistratura? A função do Poder Judiciário, segundo o Portal Brasil.gov.br, é "garantir os direitos individuais, coletivos e sociais e resolver conflitos entre cidadãos, entidades e Estado".

Decisão judicial não se discute, se cumpre! Mas, a exemplo da independência judicial tão prezada pela Ajuris, não tirem o direito dos apunhalados de expressarem sua dor! Nosso grito é silencioso e obsequioso porém reflete a tragédia que aniquila o direito singular e constitucional dos cidadãos de ir e vir em segurança pelas ruas de nossas cidades. Ou será que aboliram a Constituição e, também não nos avisaram?

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