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sábado, 29 de setembro de 2012


CÂMARAS NA SALA DE AULA; ISSO É BOM?


REVISTA ISTO É N° Edição: 2238 | 29.Set.12 - 10:46

Iniciativa de escola paulistana causa polêmica e abre debate sobre as
 necessidades e as consequências da vigilância eletrônica 

Natália Martino e Tamara Menezes 





O ambiente está sendo filmado. As imagens são confidenciais e protegidas nos 
termos da lei.? Foi com essa informação impressa em pequenas placas que os alunos
 do terceiro ano do ensino médio do Colégio Rio Branco ? um dos mais conceituados
e tradicionais de São Paulo ? foram surpreendidos quando entraram na sala de aula 
na manhã da segunda-feira 24. Inconformados com a instalação de câmeras para 
vigiar as classes sem que para isso houvesse qualquer discussão anterior, e sob o 
discurso de que estariam com a privacidade tolhida, os estudantes, em protesto, 
ocuparam um dos principais pátios do colégio, dificultando a entrada dos demais 
alunos ? 107 deles foram suspensos por um dia. Na quarta-feira 26, a diretora do 
colégio, Esther Carvalho, admitiu que falhou ao não fazer um comunicado prévio 
sobre a instalação das câmeras e os motivos que levaram à sua decisão. 
Ela também explicou que a punição dada aos alunos não se deveu apenas ao 
protesto da segunda-feira, mas foi uma resposta da escola a recorrentes atos de 
indisciplina que o grupo vinha protagonizando nos últimos meses, desafiando a 
direção, questionando notas e métodos de avaliação sem usar os canais adequados
para isso. Justa ou não a punição, o certo é que, durante a semana passada, as 
câmeras instaladas dentro das salas de aula do Colégio Rio Branco viraram tema de
uma oportuna discussão sobre a necessidade e as consequências pedagógicas da 
vigilância eletrônica em salas de aula.


SURPRESA
Instalação de câmeras sem aviso-prévio
gerou protesto no Colégio Rio Branco (SP)

Câmeras na entrada, nas quadras e nos corredores de escolas particulares e 
públicas são comuns. A novidade, que não é uma exclusividade do Colégio Rio 
Branco, foi a instalação das câmeras na sala de aula, o que divide a opinião dos 
especialistas. 
Os que se manifestam favoráveis à vigilância alegam que a indisciplina dos jovens 
de hoje está tão fora do controle que qualquer ferramenta que ajude a policiá-los é 
válida. ?Estamos vivendo em uma selva?, diz Victor Notrica, presidente do 
Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Rio de Janeiro. ?É muito triste a 
pessoa ter que se sentir vigiada, mas com os problemas de segurança e de disciplina
 acaba sendo aceitável.? A presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia, 
Quézia Bombonatto, concorda com a necessidade de impor mais limites aos jovens 
e acredita que a estratégia das câmeras não prejudica o aprendizado. ?Não podemos
 condenar uma medida que, em última instância, vai acabar inibindo práticas 
inadequadas, como o bullying?, avalia. ?Quanto ao professor, se o seu trabalho é 
adequado às propostas pedagógicas da escola, não há com que se preocupar. 
Pode ser até bom para evitar agressões contra o profissional, que são cada vez 
mais comuns?, afirma. 



No colégio Alfa CEM, no Rio de Janeiro, por exemplo, as câmeras estão presentes
na sala de aula e são usadas para vigiar o comportamento dos alunos. Segundo a 
diretora, Maria Carolina Alves, as imagens gravadas já foram usadas para provar a
alguns pais a participação de seus filhos em episódios de indisciplina. Em outro 
colégio carioca, o Pensi Ipanema, a diretora, Débora Goulart, atesta os bons 
resultados da medida adotada no ano passado. ?Inibe um pouco os alunos em 
relação à bagunça?, diz ela. ?As carteiras e as paredes das salas estão mais limpas 
e os adolescentes muito mais comportados?, relata a diretora.

Embora os resultados práticos da medida sejam positivos, a estratégia é 
questionável do ponto de vista da formação dos adolescentes. ?As normas precisam
ser interiorizadas para que a pessoa ganhe autonomia e não há como isso acontecer 
em um ambiente que condiciona o bom comportamento à vigilância?, diz Silvia 
Colello, professora de psicologia da educação na Faculdade de Educação da 
Universidade de São Paulo (USP). ?Os jovens precisam ser conscientizados sobre 
as regras de convivência, não coagidos a segui-las. Vamos ensiná-los a se comportar
só quando alguém estiver olhando??, pergunta.



De acordo com os especialistas ouvidos por ISTOÉ, as câmeras podem ser uma 
solução urgente e concreta para os graves problemas de indisciplina enfrentados 
pelas escolas atualmente, mas é necessário analisar a questão de forma mais ampla?
Não adianta só identificar o aluno que agrediu o colega. É preciso saber o que fazer 
com ele, como garantir que ele não repita o ato. A escola não é um presídio onde a 
regra é vigiar, ali a regra deve ser formar, ensinar?, diz Silvia, da USP. Para a 
educadora, a escola é um microcosmo da sociedade e os conflitos são inevitáveis. 
Por isso, as instâncias de mediação do colégio, que incluem professores, 
coordenadores e inspetores, têm de saber como lidar com isso. ?Vigiar as salas só 
vai fazer com que os alunos transfiram as práticas indesejadas para outros lugares, 
sejam os banheiros, seja a calçada em frente à escola?, diz. Segundo ela, a imposição 
de limites e o aprendizado das regras de convivência começam em casa. Mas, em 
alguns casos, o que se vê são pais que reconhecem sua incapacidade de exercer a 
autoridade e tentam transferir para a escola a função de controlar o filho.


BIG BROTHER
Colégio Alfa CEM, no Rio: a direção diz
que a disciplina melhorou com a vigilância

A questão também é polêmica do ponto de vista do professor. As câmeras são 
aliadas na hora de garantir a disciplina e podem até funcionar como ferramenta de
aprimoramento profissional. Com elas, o docente passa a ter a possibilidade de 
rever suas aulas e descobrir como melhorar. O equipamento de vigilância, porém, 
pode prejudicar a espontaneidade na relação com o aluno ou na utilização de 
métodos alternativos de ensino, como brincadeiras, por exemplo. ?Esse terceiro 
elemento no ambiente sempre vai causar apreensão e inibir discussões sobre 
assuntos polêmicos e necessários, como drogas e discriminação?, exemplifica 
Silvia Bárbara, diretora da Federação dos Professores do Estado de São Paulo, 
há mais de três décadas no magistério. A autoridade do docente para administrar 
os conflitos dos seus alunos também fica em xeque, pois esse papel é transferido 
para um árbitro que vai decidir com base nas filmagens.



No Colégio Rio Branco, onde a polêmica se instalou, a direção da escola informa 
que o equipamento de vigilância em sala de aula é parte de um projeto iniciado há 
quatro anos. No total, a instituição conta agora com 112 câmeras. Elas foram 
instaladas primeiramente nas áreas comuns e depois nos laboratórios. Apesar de 
admitir que as imagens podem ocasionalmente ser usadas para a resolução de 
conflitos entre os alunos e entre eles com os professores, a diretora garante que 
esse uso será secundário. ?É para segurança patrimonial?, afirma a diretora Esther.
 Depois de o episódio ganhar notoriedade, a direção da escola se reuniu com pais e 
explicou os motivos que levaram o colégio a adotar a medida. Até o fim da semana, 
porém, os alunos seguiam insatisfeitos. ?Quando um adolescente diz que não é 
ouvido, é bom questionarmos se ele realmente não está sendo ouvido ou se apenas 
suas demandas não foram integralmente atendidas, apesar de terem sido avaliadas?,
diz a diretora. 

Fotos: Marcelo Justo/folhapress; reprodução

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