Uma velha gorda com uma balança na mão, menor que seus volumosos seios, carregada sobre os ombros de famélico cidadão, de estatura bem menor que o cajado que a pesada senhora segura e que lhe sustenta. Tudo é maior que o cidadão, menos a balança, é claro. E quanto ao cajado, este é o Estado, que sob o olhar do famélico por justiça, está próximo, mas ao mesmo tempo, segurada pela gorda senhora, parece distante.
Talvez esta seja a essência da escultura do dinamarquês Jens Galschiot, mas isso, na interpretação do injustiçado, e não nos olhos da senhora gorda com aparência enfadada que vê o horizonte sem nenhum lampejo de esperança.
A concepção olímpica dos deuses, parece algo que ainda permeia o imaginário da justiça brasileira, principalmente nas cortes, que vivem distantes das tragédias do povo, que não sente o suor que exala do réu, que não vê as frontes cansadas das partes, das roupas mal talhadas que vestem muitos dos que busca a sua satisfação.
A justiça, representada pela toga que o Estado (in) veste o cidadão que a ela jurou servir, parece que caminha numa lógica perversa que privilegia o status quo. Até mesmo quando a modernidade chega para acelerar a justiça, a exemplo do processo judicial eletrônico-pje, não é incomum autos dormirem silenciosamente nas infraestestruturas de nuvem do judiciário. O que outrora eram calhamaços de papéis descansando em estantes abarrotadas, hoje são bytes inertes, dormindo silenciosamente na internet.
Ao que nos parece, muitos dos servidores da justiça (claro que sem generalizar) percebem o seu funcionamento como objetivo único de auto-alimentação da própria máquina, e não como satisfação das demandas sociais, e para isso buscam estabelecer "regrinhas" que afastam o jurisdicionado das suas sedes.
Não é incomum o combalido cidadão adentrar pelas portas do judiciário e na sua recepção um notável cartaz destacado com os dizeres:"Atenção, Código Penal: Artigo 331. Desacato: Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela. Pena: detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa", com pena e multa destacados em negrito. Diante de tal ameaça estatal, como o cidadão combalido reagirá àquele grosseiro (sem generalizar) servidor que, em frases curtas lhes responde sem muita ênfase?
E para finalizar, como se não bastasse, vem agora, a senhora gorda, querendo reduzir o horário da prestação jurisdicional, como se esta fosse célere e eficiente, o que mereceu protestos da OAB nacional, que ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade de número 4598, no Supremo Tribunal Federal, que foi deferida pelo ministro Luiz Fux, onde trata da proibição da redução de horário de atendimento nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) da 5ª e da 22ª regiões (Bahia e Piauí), que se estende, de maneira cautelar, para os demais tribunais do país.
Na sua própria contradição, a justiça decreta que a justiça não pode afastar-se do cidadão, não pode restringir o seu direito constitucional de acesso à prestação jurisdicional, e nós? Nós, advogados de base, na luta diária para que a justiça se torne mais leve, versátil e justa, com a balança maior do que os seus próprios seios, não podemos fugir à luta, pois como dizia Sobral Pinto: A advocacia não é profissão de covardes.
Por: Armstrong Lemos -
Fonte: Canal Ciências Criminais
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