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quarta-feira, 19 de março de 2014

Liberdade



Do latim “libertas”, de líber” = livre.
Primitivamente, no seu valor original, o homem livre era o que não se encontrava preso ou em condição de escravo. Liberdade designava, assim, o estado de quem podia agir a seu talante, não por imposição de outrem, sem sofrer coerção externa. A partir deste sentido primitivo, o termo se carregou de sentidos, na medida em que assumia novas dimensões:

1.      Aplicada ao plano social e político, liberdade significa um estado de ausência de coerção provinda do grupo, notadamente do poder público. É livre, neste sentido, o indivíduo, que pode fazer tudo o que não é proibido por lei. Nesta acepção, o termo se opõe tanto à opressão como à libertinagem, porque esta impede aos demais o uso legítimo desses mesmos direitos. O único sentido autêntico de liberdade política dentro de um regime democrático é o uso responsável dos direitos e o exercício consciente dos deveres.  Nesta ordem de idéias, importa ter presente a distinção entre liberdade teórica e real
   A primeira (liberdade teórica) é a mera permissão legal para agir; a segunda (liberdade real) exige a criação de estruturas sociais que dêem de fato a todos a possibilidade de agir, no sentido de usufruir de seus direitos de homem e de cidadão. Não compete ao Estado apenas o dever de outorgar a todos a liberdade de ensino; deve, além disso, criar um sistema escolar que possa atender a todos os que desejam exercer este direito.                                                                                           
2.      No sentido psicológico, liberdade é a capacidade do ser racional e consciente de autodeterminar-se, ante a multiplicidade de alternativas de opção que se lhe oferecem, em cada situação concreta. Neste sentido, é um dado imediato da consciência e se identifica com o livre arbítrio: todos experimentamos que podemos ser um princípio absoluto de ação, agindo ou deixando de agir, agindo desta ou daquela maneira. É uma faculdade exclusiva do ser racional, capaz de interiorizar o mundo sob uma grande variedade de aspectos; o mundo infra-humano não tem liberdade. O animal, o cachorro, por exemplo, percebe um pedaço de carne sob um único aspecto: aquilo que pode saciar sua fome; é levado por esta percepção a tomar a carne para devorá-la. O homem, vendo um pedaço de carne, pode concebê-lo abstratamente sob múltiplos aspectos: como algo que sacia a fome, algo que pode ser vendido, dissecado para um estudo histológico, ou oferecido como um dom. Esta multiplicidade o deixa em estado de indeterminação. É dele que parte a decisão para a ação, é ele que se autodetermina, porque é livre. Isto não significa, porém, que de fato o homem aja sempre assim, no pleno uso de sua liberdade. Na prática, não raro, as opções são limitadas por fatores internos, como a irreflexão, a tirania dos hábitos, a brutalidade dos instintos, a inércia do processo imitativo. Isto é: muitas das coisas que fazemos não são o resultado de uma decisão plenamente livre, ou porque são impostas pela moda que imitamos, ou porque não refletimos nas outras alternativas possíveis, ou porque não resistimos ao impulso de um hábito antigo. Entretanto, atenuações da voluntariedade dos atos não atingem, em geral, limites que eliminem a responsabilidade moral dos mesmos; quando muito chegam a constituir atenuantes mais ou menos graves. Uma pessoa que bebe por hábito nem por isso deixa de ser responsável moralmente pelos seus abusos do álcool.

3.      No sentido moral, liberdade é a condição de um ser imune de qualquer coerção que o impeça de tender, através de seus atos, à realização cada vez mais perfeita de sua natureza. Neste sentido, só Deus é plenamente livre, porque só Deus é perfeitamente aquilo que é; só Deus realiza, sem nenhuma limitação, a plenitude de sua própria essência. A liberdade psicológica, também chamada de livre arbítrio, é apenas um meio para atingir esta liberdade moral, e um meio, de resto, ambíguo. Bem utilizado, liberta; mal utilizado, escraviza. Para ficar no mesmo exemplo acima aduzido: o homem que abusa do álcool cada vez que se embriaga faz uma afirmação de sua liberdade psicológica, enquanto multiplica os atos pelos quais se determina a beber. Com isto, entretanto, se vai tornando escravo do vício, isto é, vai perdendo sua liberdade moral.


A liberdade, portanto, é risco e é conquista. É risco enquanto, pelo seu próprio indeterminismo, deixa ao homem não só a glória de optar pelo bem voluntariamente, mas também o tremendo poder de optar pelo mal. É conquista enquanto exige do homem um esforço contínuo de luta contra todas as forças internas e contínuo de luta contra todas as forças internas e externas que comprometem a realização de sua plenitude. 

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