A Banalização da Boçalidade Brasileira !
Que me perdoem os ávidos telespectadores do Big Brother Brasil (BBB),
produzido e organizado pela nossa distinta Rede Globo, mas consegui-
mos chegar ao fundo do poço. A nova edição do BBB é uma síntese do
que há de pior na TV brasileira. Chega a ser difícil encontrar as palavras
adequadas para qualificar tamanho atentado à nossa modesta inteligência.
Dizem que Roma, um dos maiores impérios que o mundo conheceu, teve
seu fim marcado pela depravação dos valores morais do seu povo,
principalmente pela banalização do sexo. O BBB é a pura e suprema
banalização do sexo.
Impossível assistir ver este programa ao lado dos filhos. Gays, lésbicas,
heteros...todos na mesma casa, a casa dos “heróis”, como são chamados
por Pedro Bial. Não tenho nada contra gays, acho que cada um faz da
vida o que quer, mas sou contra safadeza ao vivo na TV, seja entre
homossexuais ou heterossexuais. O BBB está na realidade em busca do
IBOPE. Veja como Pedro Bial tratou os participantes do BBB.
Ele prometeu um“zoológico humano divertido”. Não sei se será divertido,
mas parece bem variado na sua mistura de clichês e figuras típicas.
Pergunto-me, por exemplo, como um jornalista, documentarista e escritor
como Pedro Bial que, faça-se justiça, cobriu a Queda do Muro de Berlim,
se submete a ser apresentador de um programa desse nível.
Em um e-mail que recebi há pouco tempo, Bial escreve maravilhosamente
bem sobre a perda do humorista Bussunda referindo-se à pena de se
morrer tão cedo.
Eu gostaria de perguntar se ele não pensa que esse programa é a morte
da cultura, de valores e princípios, da moral, da ética e da dignidade.
Outro dia, durante o intervalo de uma programação da Globo, um outro
repórter acéfalo do BBB disse que, para ganhar o prêmio de um milhão
e meio de reais, um Big Brother tem um caminho árduo pela frente,
chamando-os de heróis. Caminho árduo? Heróis? São esses nossos
exemplos de heróis? Caminho árduo para mim é aquele percorrido por
milhões de brasileiros, profissionais da saúde, professores da rede
pública (aliás, todos os professores), carteiros, lixeiros e tantos outros
trabalhadores incansáveis que, diariamente, passam horas exercendo
suas funções com dedicação, competência e amor e quase sempre são
mal remunerados.
Heróis são milhares de brasileiros que sequer tem um prato de comida
por dia e um colchão decente para dormir, e conseguem sobreviver a
isso todo dia.
Heróis são crianças e adultos que lutam contra doenças complicadíssimas
porque não tiveram chance de ter uma vida mais saudável e digna. Heróis
são inúmeras pessoas, entidades sociais e beneficentes, Ongs, voluntários,
igrejas e hospitais que se dedicam ao cuidado de carentes, doentes e
necessitados (vamos lembrar de nossa eterna heroína Zilda Arns).
Heróis são aqueles que, apesar de ganharem um salário mínimo, pagam
suas contas, restando apenas dezesseis reais para alimentação, como
mostrado em outra reportagem apresentada meses atrás pela própria Rede
Globo.
O Big Brother Brasil não é um programa cultural, nem educativo, não
acrescenta informações e conhecimentos intelectuais aos telespectadores,
nem aos participantes, e não há qualquer outro estímulo como, por
exemplo, o incentivo ao esporte, à música, à criatividade ou ao ensino de
conceitos como valor, ética, trabalho e moral. São apenas pessoas que se
prestam a comer, beber, tomar sol, fofocar, dormir e agir estupidamente
para que, ao final do programa, o “escolhido” receba um milhão e meio de
reais. E ai vem algum psicólogo de vanguarda e me diz que o BBB ajuda
a "entender o comportamento humano". Ah, tenha dó!!!
Veja o que está por de tra$$$$$$$$$ do milhonário BBB: José Neumani da
Rádio Jovem Pan, fez um cálculo de que se vinte e nove milhões de pessoas
ligarem a cada paredão, com o custo da ligação a trinta centavos, a Rede
Globo e a Telefônica arrecadam oito milhões e setecentos mil reais.
Eu vou repetir: oito milhões e setecentos mil reais a cada paredão.
Já imaginaram quanto poderia ser feito com essa quantia se fosse dedicada
a programas de inclusão social, moradia, alimentação, ensino e saúde de
muitos brasileiros? (Poderia ser feito mais de 520 casas populares; ou
comprar mais de 5.000 computadores)
Essas palavras não são de revolta ou protesto, mas de vergonha e
indignação, por ver tamanha aberração ter milhões de telespectadores
vendo futilidades. Em vez de assistir ao BBB, que tal ler um livro, um poema
de Mário Quintana ou de Neruda ou qualquer outra coisa..., ir ao cinema...,
estudar... , ouvir boa música..., cuidar das flores e jardins... , telefonar para
um amigo..., visitar os pais e os avós..., pescar..., brincar com as crianças...,
namorar... ou simplesmente dormir. Assistir ao BBB é ajudar a Globo a
ganhar rios de dinheiro e destruir o que ainda resta dos valores sobre os
quais foi construído nossa sociedade.
Luis Fernando Veríssimo É cronista e escritor brasileiro
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