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segunda-feira, 4 de novembro de 2013

As novas relações de poder

vitruvian

São inegáveis as consequências positivas da era global e digital que nasce. O aumento da produtividade e o barateamento de serviços são bons exemplos. Mas há, por outro lado, um aspecto que preocupa.
Mercados só funcionam quando o Estado provê pressupostos de organização. Investimentos requerem o funcionamento saudável das instituições. Como demonstraram Daron Acemoglu e James A. Robinson em “Por Que as Nações Fracassam”, as sociedades que não deram certo foram aquelas que não conseguiram construir instituições robustas.
Mas a vida é dinâmica. Mesmo sociedades que conseguiram construir instituições fortes e se desenvolveram podem vir a assistir a uma regressão. Niall Ferguson, em “A Grande Degeneração”, defende que o mundo ocidental entrou em decadência depois de um período longo e próspero em razão do desgaste de instituições outrora vigorosas.
E isso aconteceu não por outro motivo que o desenvolvimento da era global e digital.
Enquanto as relações de poder tradicionais estão em processo de putrefação, contrapoderes emergem. A primeira vítima é o Estado nacional. Os desafios de políticas públicas não se resolvem em sua esfera. Regulação de mercados, eficiência de sistemas tributários, combate ao crime organizado –nada disso terá solução sem alguma forma de internacionalização articulada das iniciativas de caráter público.
A globalização e a digitalização fornecem instrumentos para empresas, organizações e indivíduos driblarem as tentativas de controle e regulação dos Estados. Luta inglória, que só faz aprofundar a perda de credibilidade das instituições.
Manifestações pelo mundo mostram com que rapidez um evento circunscrito pode se transformar num tsunami de contestações.
Os sistemas políticos em geral–e no Brasil não é diferente– são organizados de maneira que a luta pelo controle do Estado se traduz em disputas midiáticas simplistas. A lógica do marketing político costuma levar à venda irresponsável de esperanças por meio de soluções inviabilizadas pela fragilidade do Estado.
Os partidos dificilmente conseguirão protagonizar iniciativas de solução duradoura. A razão é simples: eles disputam o poder local quando os problemas são globais.
É preciso avançar em três frentes: fortalecer entidades da sociedade civil, fazer os ajustes públicos em nível local e trabalhar na construção de uma coordenação nas áreas que exijam esforços internacionais.
Como procurei argumentar, e este é o ponto que quero destacar neste artigo, a agenda de lutas não pode ficar restrita às frentes nacionais. Poderes locais ajudam a florescer instituições da sociedade civil, que, reciprocamente, melhoram o funcionamento dos poderes locais.
Mas a construção de sistemas eficazes de gestão dos desafios atuais, que são internacionais, só será possível com iniciativas internacionais.
É necessário um projeto de reformas que venha de uma sociedade internacional articulada e ativa, protagonizada por instituições civis que percebam que, sem sua atuação organizada, não haverá pressão para que as disputas locais passem a considerar também a solução de temas internacionais.
Essa é a resposta que se espera desta nova era.
Fonte: Antonio Kandir, engenheiro, foi ministro do Planejamento (governo Fernando Henrique Cardoso) / Publicado originalmente no jornal Folha de S.Paulo.

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