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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

CARNAVAL, Tempo de conspiração



“Na ética companheira, o mais importante não é fazer errado, é não ser flagrado.
Falar com a língua presa não é nada, o problema é ter preso o rabo.”
Nelson Motta

Waldo Luís Viana*

         Como se fala de Momo, de bicheiros, escolas de samba, blocos e mulheres nuas no Carnaval. A festa pagã, jovem e bonita como a temperatura de verão, atrai milhões de turistas. Estes, porém, não acostumados a tantos folguedos, se esbaldam, procurando esquecer a seriedade crônica de seus respectivos lugares de origem. Já disseram que o Brasil não é um país sério – pois é!, nossa cultura de faz-de-conta, macunaímica,  tem o condão de por alguns dias decretar a ilusão,  o sorriso e a brincadeira como norma de conduta e nisso somos absolutamente organizados e institucionais.
         No entanto, na obscuridade do recolhimento anônimo e provisório, as elites reúnem-se em lugares ermos, longe da vista despreocupada dos foliões, para simplesmente conspirar. Com eles, o séquito atento e adulador de assessores, sempre atentos, vai se acercando de quem manda para participar dos projetos cavilosos, urdidos longe da mídia, ocupada com os afazeres e as luzes da farra.
         Se inda fosse jornalista – eu que frequentei tantas redações e aprendi  muito com grandes profissionais sem diploma – apostaria em apurar os movimentos surdos dos grandes políticos, empresários e banqueiros. Para onde vão esses senhores, num banho de imersão de completo anonimato? O que discutem à sombra de seus esconderijos?
         Na verdade, existe uma classe dirigente decidida,  que paga certos profissionais para retirá-la das páginas de jornais e revistas e, não querendo realmente aparecer, puxam os cordéis do teatro de fantoches, utilizando-se dos feriados para instruir os ventríloquos políticos. O que acontecerá, então, quando o país voltar a ser sério? Quando a cortina do palco novamente se abrir e virmos, atoleimados, a dimensão do abismo?
         O Brasil prepara-se, celeremente, para não receber a crise européia-americana no colo, porque é orgulhoso exportador de commodities e produtos primários, a preços vis. Nossa desindustrialização interna cresce a olhos vistos, o custo-Brasil está pela hora da morte e os itens diversos de nossa infraestrutura vivem em crise permanente. A sexta economia do mundo é, infelizmente, a 84ª em Índice de Desenvolvimento Humano e não chegou ao cidadão. Nosso crescimento, vítima de um estado hipertrofiado, encobre uma Nação das mais desiguais do planeta...
         Empreiteiros, banqueiros, industriais e políticos, porém, têm o que discutir em seus tabuleiros, trabalhando os cenários da  continuidade do poder. E sabem, muito bem, que a garantia da supremacia depende de atenção e movimentação contínuas. Afinal, é preciso manter o povo sonhando, enganado e convencido através da TV e do futebol, da música caipira e evangélica de que vivemos no melhor dos mundos...
         A política é a estética do engano e a corrupção e o superfaturamento, seus filhos prediletos. O país, suspenso em alienação erótica, torna-se presa fácil desses senhores, oligarcas e plutocratas, com  bocas escancaradas para novas tacadas, no interminável banquete de retaliação do país.
         Ao contrário do que se imagina, eles não descansam no Carnaval. Alinhavam conchavos para o domínio das prefeituras, por exemplo, visando à conquista, logo mais à frente, do pleito real para presidente. Tirando os cânceres, que são lamentáveis probabilidades de percurso – e absolutamente não previsíveis – os personagens já escolheram os perfis, adulando as próprias máscaras. São pierrôs e arlequins no poder, num baile interminável de troca de favores, cargos, comissões e altas negociatas. Idólatras do poder, sem religião, ideologia ou Deus...
         Nesse contexto, sabe-se que o Congresso, onde ficam expostos os deputados e senadores, é um túmulo. Quase todos eles querem  singrar para o Executivo, onde poderão mandar mais e comover as próprias bases eleitorais. Sabem que o que lá se discute não tem a menor repercussão, porque o eleitorado, no período entre eleições, nada espera dos abonados senhores, intérpretes obedientes das classes dominantes. E o povo só os fica assistindo, ressabiado, atrás dos cordões de isolamento!
         A respiração suspensa – qual será a melhor escola de samba? – é substituída ali  por acertos subterrâneos que ninguém vê e jamais serão publicados. No entanto, o que for decidido nesses dias talvez valha para o ano inteiro. Os planos estratégicos são assim construídos, longe do público, e permanecerão secretos, sendo percebidos os seus contornos apenas na medida em que o tempo passe.
         Nem é preciso falar-se em  trilaterais capitalistas, grupos bilderbergs e encontros de espiões. Essas suspeitas tornam-se sempre inviabilizadas por algum professor universitário especialmente escalado para o papel. A mesma coisa acontece com a provável existência dos discos voadores: quem os vê e relata fica desmoralizado, porque o que interessa mesmo é manter a mentalidade dos que acreditam no ....
         O Carnaval é o interlúdio em que a carne vale, antes da Quaresma, período que antigamente servia como recolhimento e respeito, antes da Páscoa. Embora isso não funcione mais, diante das paradas gays e do esmagamento moral das famílias, sabe-se que, pelo menos, as elites mantém o recato do segredo na manutenção do poder.
         No fundo, elas querem certa estabilidade para manter o que está eternamente conquistado, desde as capitanias hereditárias. O problema é que o dinheiro é um sujeito encardido e veloz, que teima em mudar de mãos mafiosas, precisando ser vigiado 24 horas por dia por seus possuidores.
         O dinheiro não aceita desaforo e é erodido pelo tempo, por causa dos juros compostos. Essa realidade é contínua, não é quântica porque tridimensional. Depende do conservadorismo desses senhores, que acham que estão suspensos no ar, protegidos dos movimentos do Universo, só porque têm dinheiro.
         Já dizia nossa grande atriz Elke Maravilha: “tem gente que é tão pobre, que só tem dinheiro.” Pois bem: a elite está a solta, escondida nesse Carnaval e em todos os outros, buscando a manutenção de seus privilégios, tão duramente conquistados.
         Rebola povo – este é o seu papel. Sambe e esqueça o destino. O Carnaval está aí, com suas máscaras e alegrias. E os outros, seus patrões, continuarão mandando, porque aqui a corrupção caminha, desde Pero Vaz...
         Squindô, Squindô..

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(*) - Waldo Luís Viana, 52, é escritor, economista e jornalista. 

Formou-se em Economia pela Universidade Gama Filho, mas, desde cedo, sua vocação o conduziu ao jornalismo e ao assessoramento de alto nível de parlamentares, cientistas, professores universitários, mestrandos e doutorandos em suas diversificadas necessidades corporativas e acadêmicas

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