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quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Reflexões sobre o Decreto nº 8.243, de 23 de maio de 2014

*Escrito por Saulo de Tarso Manriquez | 06 Junho 2014 


Gramsci propunha um Estado integral ou ampliado, no qual a distinção entre Estado e sociedade civil tornar-se-ia imperceptível.
Se o PT fracassar nas eleições, o partido não mais conduzirá o Estado ampliado, mas subsistirá, no governo de qualquer partido, por meio da sociedade ampliada que o partido mesmo criou.


O Decreto nº 8.243, de 23 de maio deste ano, que cria a “Política Nacional de Participação Social” e o “Sistema Nacional de Participação Social” tem por finalidades: 
1) manter o PT, indiretamente, como protagonista dentro do governo federal (no caso de uma
    eventual derrota do partido nas urnas); 
2) corroer a democracia representativa; 
3) enfraquecer o Congresso; 
4) acelerar a criação de uma nova Constituição.

Como Vivian Freitas, em artigo intitulado“O risco de golpe: o decreto n.º 8.243/2014 e o plebiscito constituintejá abordou a relação entre o decreto em tela e o desejo do PT em criar uma nova Constituição, o presente artigo não versará sobre esse aspecto.

1. Quem serão os participantes na Política Nacional de Participação e no Social Sistema Nacional de Participação Social?
O art. 1º do Decreto nº 8.243/2014 institui a Política Nacional de Participação Social (PNPS) estabelecendo o objetivo de “fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil”. E o art. 4º, I, estabelece, dentre outros objetivos da PNPS, o de “consolidar a participação social como método de governo”. Em princípio não há nada de muito estranho nisso, pois existem outras normas vigentes no Brasil que valorizam a participação social no âmbito da Administração Pública (v.g. artigos 32 e 33 da Lei nº 9.784 , de 29 de janeiro de 1999 e art. 2º, art. 4º, III, “f”, e § 1o do art. 32 da Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001). Ocorre, no entanto, que ao contrário do que acontece com outras normas que enfatizam a participação, colocando-a como uma possibilidade ou como ferramenta de planejamento a ser ou não concretizada pelos administradores públicos, o Decreto nº 8.243 enfatiza a promoção da participação como um dever da Administração Pública Federal e, logo, acaba transformando a participação social em um “direito”[1]. O art. 3º do referido decreto concebe a participação como um direito e o art. 5º do mesmo decreto diz que “os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta deverão, respeitadas as especificidades de cada caso, considerar as instâncias e os mecanismos de participação social, previstos neste Decreto, para a formulação, a execução, o monitoramento e a avaliação de seus programas e políticas públicas”, ou seja, o decreto amarra a atuação do governo federal à participação dos movimentos sociais, coletivos e ONGs, colocando-os como juízes do agir estatal.

O art. 2º, I, do Decreto nº 8.243 diz que a sociedade civil abrange “o cidadão, os coletivos, os movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”. Para compreender o alcance das pretensões desse decreto é preciso refletir sobre o que se entende usualmente por “movimentos sociais”, “coletivos” e sobre a temática da participação.
Há quem diga, como é o caso de Maria da Glória Gohn, que os movimentos sociais abrangem atores coletivos de diferentes classes e com interesses distintos[2], entretanto, convém lembrar que além da noção de movimento social estar historicamente relacionada com movimentos que lutam por transformações sociais[3] – amiúde mediante expedientes revolucionários -, o conceito corrente de movimentos sociais está muito longe da leitura que Gohn faz dos mesmos. A noção contemporânea de movimentos sociais não é pluralista, pois exclui grupos que procuram influenciar os governos de forma desalinhada da agenda socialista. Assim, para todos os efeitos, as associações de empresários, os grupos pró-vida, as associações religiosas cristãs não progressistas, as organizações que lutam contra o desarmamento civil, entre outras, não são considerados “movimentos sociais”. Nada que cause espécie, haja vista que atual conceituação de movimento social é um upgrade do conceito de classes marxista[4]. Se em Marx existia uma classe opressora e outra oprimida, para a new left existem - dentro do vasto portfólio dos maniqueísmos que produzem - de um lado as forças “antidemocráticas”, “antipopulares” e “fascistas” e de outro os “movimentos sociais”.

Os coletivos por sua vez seguem a mesma lógica. Em verdade, pode-se afirmar que são desdobramentos ou nós dentro da rede dos movimentos sociais. Não existem “coletivos” fora da esfera de influência das esquerdas.

Movimentos sociais e os coletivos, portanto, são aqueles que as forças de esquerda classificam como tal.

Embora o decreto coloque o cidadão dentro do conceito de “sociedade civil”, a “participação” se dará por meio dos movimentos sociais e coletivos.

Lembra Paulo Bonavides que “o homem do Estado moderno é homem apenas acessoriamente político”[5]. Esse homem não é como o homem dos tempos da democracia ateniense, que podia, na medida em que lastreado por uma economia escravocrata, dedicar-se quase que integralmente às discussões políticas realizadas na Ágora. Nas sociedades modernas, os homens são em sua grande maioria indivíduos que lutam ou para transcender a linha das necessidades básicas da vida ou para garantir um mínimo de bem-estar para suas famílias. Destarte, a política divide espaço com inúmeras atribuições e reflexões do cotidiano, vindo a ser para muitos o último lugar na escala de prioridades.

Diga-se também que a participação requer tempo e são poucas as pessoas que realmente dele dispõem.

Os regimes totalitários caracterizam-se, dentre outras coisas, pela pretensão de colocar a política no centro da vida das pessoas. Não se quer dizer com isso que os totalitarismos estão abertos a uma espécie de controle “social”, “popular” ou “cidadão”, e nem se está aqui sugerindo que tais regimes são “participativos”; longe disso. Os Estados totalitários requerem uma aparência de cidadania total. Norberto Bobbio, ao analisar a democracia direta grega e o modelo rousseauniano de democracia, observou que “o cidadão total e o estado total são as duas faces da mesma moeda”, tendo em comum o princípio de que “tudo é política”, o que implica “a redução de todos os interesses humanos aos interesses da pólis, a politização integral do homem, a resolução do homem no cidadão, a completa eliminação da esfera privada na esfera pública [...]”.[6]

As pessoas comuns, que veem na política um assunto secundário, que empreendem, que trabalham, que estudam e que, por essas razões, às vezes não têm tempo ou disposição para sequer participar de uma reunião de condomínio, serão alijadas do suposto processo participativo sugerido pelo decreto em comento. Na verdade, não é para elas que o decreto se volta. O decreto alcança um público específico: os cidadãos totais, os cidadãos compedigree devidamente certificado pelo partido hegemônico ou por alguma força de esquerda. O decreto destina-se, enfim, a pessoas e organizações propositadamente preparadas para lhe dar efetividade e “legitimidade”. Quem participará, portanto, são os movimentos sociais, os coletivos e os grupos dotados de uma organização capaz de mobilizar e capacitar interessados para uma atuação concreta e decisiva nas mais diversas esferas do governo federal.

2. Construindo uma identificação artificial entre sociedade civil, movimentos sociais, coletivos e ONGs
O Decreto nº 8.243 acabará por criar uma identificação artificial entre a sociedade civil e os movimentos sociais, os coletivos e as ONGs. Destarte, quando movimentos sociais e coletivos, institucionalizados ou não, participarem na formulação, na execução, no monitoramento e na avaliação de programas e políticas públicas do governo federal entender-se-á que foi a sociedade civil que participou.
sociedade civil - ou simplesmente a sociedade - é “a esfera das relações entre indivíduos, entre grupos, entre classes sociais, que se desenvolvem à margem das relações de poder que caracterizam as instituições estatais”[7]̄[8]. O conceito de sociedade civil não é o mesmo de movimento social ou de coletivo. Movimentos sociais e coletivos fazem parte da sociedade civil, mas não a representam em sua totalidade e complexidade.
As democracias contemporâneas convivem com novas realidades que desafiam governos e estrategistas políticos. Identificam-se nas sociedades, além dos habituais poderes mais ou menos institucionalizados, uma sociedade de organizações – privadas, governamentais e não governamentais. As organizações, lembra Richard Hall, “são um componente predominante na sociedade contemporânea”[9]. Charles Perrow, em seu artigo A society of organizations chegou a dizer que as organizações “absorveram a sociedade”[10]. De certa forma, as organizações dão voz aos diversos segmentos da sociedade, mas pode ser perigoso enfatizar isso, pois se acaba por favorecer as perspectivas que têm por escopo forjar uma equivalência entre alguns movimentos ou grupos com a totalidade da sociedade.
Convém destacar que a proliferação de organizações não governamentais não é necessariamente fruto de expressões espontâneas da sociedade. Nessa proliferação há também a presença de uma estratégia política de ideólogos de esquerda que se volta para a conquista ou reconquista da hegemonia socialista. Nesse sentido é interessante lembrar que Jürgen Habermas, verificando que após o colapso da União Soviética os socialistas ficaram, por assim dizer, “órfãos”, recomendou ao movimento socialista – que no Estado soviético tinha uma feição estatal - que se distribuísse e se canalizasse em organizações sociais[11].
Pode-se dizer que Habermas pega carona no pensamento de Antonio Gramsci. Gramsci propunha um Estado integral ou ampliado, no qual a distinção entre Estado e sociedade civil tornar-se-ia imperceptível. O Estado ampliado é aquele que não se limita às suas próprias instituições e órgãos, pois nele “a sociedade civil, por intermédio das organizações privadas de hegemonia (a expressão será trabalhada logo adiante), indica a ‘direção’ política e cultural, e passa a executar certas funções públicas que antes pertenciam exclusivamente à esfera estatal”[12].  
Gramsci cunhou a expressão aparelhos privados de hegemonia para designar as instituições da sociedade civil voltadas a estabelecer uma visão de mundo hegemônica sobre as outras visões mediante a ocupação de espaços[13]. Apesar de o conceito de aparelho privado de hegemonia poder, em princípio, ser aplicado a organizações que representam diferentes correntes ideológicas, seu uso está umbilicalmente atrelado aos discursos e projetos socialistas orientados para a conquista da hegemonia.
Quando Gramsci fala em aparelhos privados ele está, em princípio, pensando especificamente em cooptar o empresariado, os proprietários, enfim, a "classe dominante", com vistas a atrelar a sociedade civil ao Estado. Com o tempo, aparelhos de outras configurações, ou seja, não necessariamente "privados" no sentido preciso do termo, foram sendo inseridos na dinâmica da luta pela hegemonia. o termo "privado" aproximou-se cada vez mais da ideia de não-estatal. Dizer "privado" não quer mais necessariamente dizer "empresarial" ou algo relacionado com a classe que Gramsci considerava dominante. O crescimento vertiginoso das ONGs e o fortalecimento dos movimentos sociais trouxeram novos subsídios para uma teorização estratégica sobre os aparelhos de hegemonia.
Gramsci trabalha estrategicamente com o conceito genérico de “sociedade civil” (ou “sociedade civil organizada”), camuflando por meio dele a orientação para ação (que pode ou não se restringir ao campo do discurso) direcionada a movimentos específicos comprometidos com a imposição da hegemonia socialista.
Os movimentos sociais, os coletivos e as ONGs são aparelhos privados de hegemonia a serviço da ampliação do Estado; da “identidade-distinção” entre a “sociedade civil” e a sociedade política (Estado)[14].

3. A corrosão da democracia representativa e o enfraquecimento do Congresso
O Decreto nº 8.243 tende, reitere-se, a forjar uma identificação entre a sociedade civil e osmovimentos sociais, coletivos e ONGs. O corolário dessa identificação artificial será a ressignificação das noções de representação política e de legitimidade democrática. Quando os movimentos sociais, os coletivos e as ONGs participarem das decisões do governo federal, propalar-se-á a ficção de que quem está participando é a própria sociedade civil. E mais: sugerir-se-á que a sociedade fora representada.
O Decreto nº 8.243 prepara o terreno para o fim da legitimação democrática delineada na Constituição de 1988, a qual só se dá pelas vias eleitorais que definem os representantes e pelas vias plebiscitária e referendária (acessórias e sujeitas a uma série de limitações constitucionais) nas quais toda a população de um município, de um Estado-membro ou de toda a nação, é chamada a se manifestar sobre algum assunto. A representação e a legitimidade democrática serão divididas entre os movimentos sociais, os coletivos, as ONGs e o Congresso.

4. Mantendo o protagonismo a qualquer custo
No caso de o PT ser derrotado nas urnas, o Decreto nº 8.243/2014 garantirá ao partido a permanência nas estruturas do Estado por meio das organizações e movimentos a ele atrelados.
É preciso compreender que o Decreto nº 8.243/2014 é fruto de uma longa trajetória de consolidação da hegemonia socialista.
Durante todo o tempo em que esteve no comando do Estado, o PT empenhou-se em ampliá-lo, criando e fortalecendo seus aparelhos de conquista da hegemonia: os movimentos sociais, os coletivos e as ONGs.
As forças políticas que conduzem o Estado ampliado procuram justificá-lo e legitimá-lo por meio do expediente retórico que sugere que quem na verdade se amplia é a sociedade. Diz-se então que é a sociedade ampliada (movimentos sociais, coletivos e ONGs) que controla o Estado e não o contrário[15].  
Se o PT fracassar nas eleições, o partido não mais conduzirá o Estado ampliado, mas subsistirá, no governo qualquer partido, por meio da sociedade ampliada que o partido mesmo criou.

O Decreto nº 8.243/2014 rateia preventivamente a condução do governo federal entre o PT e qualquer outro grupo político que venha a assumir o poder. Não obstante, o decreto permitirá ao PT obstar e prejudicar a atuação de outro partido que eventualmente assuma o governo federal.  
             
Notas:

[1]Em que pese a Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001 postular que a participação deve ser garantida, o que implica, de certa forma, ver na participação uma espécie de “direito”, é preciso dizer que a participação no caso restringe-se ao âmbito dos municípios e que o conceito de participação envolve não apenas os ditos movimentos sociais, mas também as pessoas afetadas ou interessadas em dada política conduzida pelo gestor municipal. Há, é claro, na referida lei, o potencial para um aparelhamento ideológico da participação, mas nada que se assemelhe ao que pretende o Decreto nº 8.243. 

[2]
 Cf. GOHN, Maria da Glória. Teorias dos movimentos sociais. Paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo: Loyola, 1997.

[3]
 Na obra História do Movimento Social Francês de 1789 até o Presente (presente, no caso, 1850), publicada no ano de 1850, o sociólogo alemão Lorenz von Stein cunhou a expressão “movimento social”, atrelando-a às lutas políticas dos trabalhadores e daqueles que lutavam contra as desigualdades. Pode-se dizer que com o tempo a noção de movimento social acabou sendo ou preterida ou absorvida pelo conceito marxista de classe. 

[4]
 A partir da década de 1960, a abordagem clássica marxista, que inseria os movimentos sociais dentro da ideia de luta de classes, foi aos poucos dando lugar a uma nova teoria sobre os movimentos sociais ou novos movimentos sociais. Autores como Manuel Castells foram decisivos nesse trabalho de resignificação. 

[5]
BONAVIDES, Paulo. Ciência política. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 273. 

[6]
 BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986, p. 43. 

[7]
 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política, 2 v. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2008, p. 1210. 

[8]
 Embora ao longo da história política dos povos tenham sido desenvolvidas concepções bastante distintas de “sociedade civil”, optou-se aqui, pela necessidade de tentar explicar a questão de forma breve e simplificada, por um conceito atual que sintetizasse a carga semântica da expressão.

[9]
 HALL, Richard H. Organizações: estruturas, processos e resultados. São Paulo: Prentice Hall, 2004, p. 01. 

[10]
 PERROW, Charles. A society of organizations. Trabalho apresentado em forma de seminário no Center for Advanced Study in the Social Sciences of the Juan March Institute - Madrid , 22 de maio de 1989. Disponível em: <http://www.march.es/ceacs/Publicaciones/working/archivos/1990_12_en.pdf> Acesso em 10 jan 2011. 

[11]
 HABERMAS, Jürgen. A revolução e a necessidade de revisão na esquerda – o que significa socialismo hoje? In: BLACKBURN, Robin (org.). Depois da queda: o fracasso do comunismo e o futuro do socialismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992, p. 45-71.

[12]
 COUTINHO, Sergio Augusto Avellar. A revolução gramscista no ocidente: a concepção revolucionária de Antônio Gramsci em os Cadernos do Cárcere. Rio de Janeiro: Sol, 2005, p. 57. 

[13]
 Cf. GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere, volumes 1, 3 e 4. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2001. 

[14]
 COUTINHO, Sergio Augusto Avellar, op. cit., p. 47.

[15]
Cf. COUTINHO, Sergio Augusto Avellar, op. cit., p. 57.

*Saulo de Tarso Manriquez é mestre em direito pela PUC-PR.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Reações ao Decreto 8.243 — a sociedade ainda respira. Até quando?


A principal característica de um governo esquerdista é que ele jamais se contenta em governar de acordo com a ordem legal, instituída. Ele sempre acredita que detém a chave, a poção, a receita miraculosa para transformar o país no que, ele imagina, será o melhor dos mundos. O problema é que o melhor dos mundos, quando se trata da esquerda, está sempre próximo do que imaginamos ser o Inferno, quando não é o próprio Inferno.

A prova do que afirmo encontra-se não apenas na história das revoluções — vejam o Purgatório congelado no tempo em que Cuba se transformou, sobrevivendo graças à submissão de um povo sem esperança e sem armas e à propaganda esquerdista mundial, ou os milhões de crimes perpetrados pelo comunismo soviético —, mas também no presente, no cotidiano da sociedade brasileira, sequestrada, em grande parte, pelo pior tipo de populismo que já conhecemos, superior, em método e recursos, aos refinamentos do getulismo.

Esta semana, mais uma vez, o governo ensaiou uma tentativa de golpe. O alarme foi dado pelo editorial do Estadão, “Mudança de regime por decreto”, e rapidamente se espalhou pelas redes sociais e blogs, transformando-se em um fenômeno viral.

De fato, enquanto os políticos de oposição dormem, refestelados em seus altos salários e mordomias, parcela da sociedade vigia, atenta, os ensaios para se criar uma ditadura. As reações foram múltiplas: Reinaldo Azevedo pontificou: “A ‘democracia direta’ de Dilma é ditadura indireta do PT”. Alexandre Borges deu uma breve mas incisiva aula de história em “Todo poder aos sovietes petistas”. Felipe Moura Brasil denunciou a lentidão dos tucanos, sempre envergonhados ou sempre pactuando silenciosamente com o governo, no post“Ronaldo Caiado sai na frente de Aécio: ‘É golpe do PT!”. No artigo “Um tumor inserido por decreto”, Fábio Blanco sangrou ainda mais a manobra traiçoeira. E Milton Simon Pires não deixou por menos: mostrou, em “Brasil 8243”, como o PT pretende destruir as instituições do país.

O mais didático e irônico, contudo, foi Erick Vizolli, no sempre ótimo Liberzone. No artigo “Afinal, o que é esse tal Decreto 8.243?, Vizolli mostra que o sistema representativo, apesar de todos os seus defeitos, ainda é a única forma de nos protegermos de um Estado controlado por grupos que não têm compromisso com a democracia ou a liberdade, mas apenas com suas próprias ideologias.

Todos esses articulistas me recordaram as reflexões de Roger Scruton em The Uses of Pessimism and the Danger of False Hope (As vantagens do pessimismo, Editora Quetzal, Lisboa). No Capítulo 6, “A Falácia do Planeamento”, Scruton faz uma brilhante analogia entre a estrutura da União Europeia e a forma como Lenin aboliu, na Revolução Russa, “todas as instituições através das quais o partido e seus membros pudessem ser responsabilizados pelo que fizeram”, permitindo que um erro se sucedesse a outro, sempre maior, sempre mais criminoso.

Scruton reflete como se tivesse acabado de ler o decreto de Dilma Roussef: “Quando os poderes de Governo estiverem adequadamente repartidos e quando os que detêm a soberania puderem ser expulsos por uma votação, os erros podem encontrar o seu remédio. Porém suponhamos que as instituições de Governo estão montadas de tal maneira que toda a concentração de poder é irreversível, de modo que os poderes adquiridos pelo centro nunca podem ser recuperados. E suponhamos que aqueles que mandam no centro são nomeados, não podem ser afastados a pedido do povo, encontram-se em segredo e guardam poucas ou nenhumas atas das suas decisões. Acha que, nessas circunstâncias, existem condições em que possam ser retificados erros ou mesmo convincentemente confessados?”.

Todos os infinitos casos de corrupção; todas as manifestações de ódio coletivo que têm tomado as ruas; o longo e incansável trabalho de controle ideológico feito pelo Ministério da Educação, censurando, de forma velada, o conteúdo de milhões de livros didáticos distribuídos país afora; todas as tentativas de manter sob vigilância a mídia e a Internet; o evidente controle do Executivo sobre parcela do Congresso e do Supremo Tribunal Federal — tudo contribui para transformar o Decreto 8.243 na cereja do bolo.

Se ainda podemos ter alguma esperança, ela reside no fato de que eles sempre acabam destruindo uns aos outros. “Doze vozes gritavam cheias de ódio e eram todas iguais. Não havia dúvida, agora, quanto ao que sucedera à fisionomia dos porcos. As criaturas de fora olhavam de um porco para um homem, de um homem para um porco e de um porco para um homem outra vez; mas já se tornara impossível distinguir quem era homem, quem era porco” — conta George Orwell no final de A Revolução dos Bichos.

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Basta sentar-se à mesa rodeado de apostilas e livros para se dar conta de que a dedicação aos estudos para concursos públicos exige um poder de concentração para lá de afiado.
5 atitudes para conseguir estudar mais em menos tempo
Na base da falta de foco estão velhos e novos vilões. O som hipnotizante da televisão, o toque repetitivo do celular, redes sociais e aplicativos de mensagens (como o WhatsApp) são alguns deles.
No entanto, vencê-los é apenas questão de (muita) força de vontade. Afinal, basta apertar o botão desligar para ter a certeza de não ser interrompido.
Mas e quando é o pensamento que insiste em voar longe levando o concurseiro a adiar a leitura de uma doutrina do Direito ou a resolução daqueles exercícios “cascudos” de raciocínio lógico?
Se a raiz da distração está fincada dentro da sua cabeça, algumas atitudes antes e durante o período de estudos podem ajudar.
Veja o que fazer para aumentar o poder de concentração e conseguir estudar mais em menos tempo.
Antes
1) Preste atenção ao fluxo de respiração
Sim, investir 2 minutos da sua atenção (apenas) no ritmo da respiração pode ser decisivo para baixar a ansiedade e melhorar a concentração. “É um exercício simples, que dá para fazer em casa e baixar a adrenalina”. Experimente alongar o tempo de inspiração e, sobretudo, o de expiração durante estes minutos.
2) Foque em um ponto estático
O esvaziamento da mente é um dos pressupostos da meditação cujo objetivo é conectar o praticante ao momento presente. Seus benefícios para ativar a capacidade de foco são propagados há milhares de anos.
Para se ter uma ideia, na época do julgamento do mensalão, o então ministro do STF, Ayres Britto, contou que 30 minutos diários de meditação bastavam para encarar com serenidade a pressão e a pesada carga de trabalho.
Nunca tentou? Para começar, imagine, por alguns minutos, a chama de uma vela e tente controlar o movimento com a mente. “O desafio é não pensar em mais nada, o que é bem difícil”.
Durante
3) Vá logo ao limite da sua capacidade mental
Com mais tranquilidade, é hora de partir para os livros e apostilas. Mas não comece pelo caminho mais fácil, ou seja, aquela matéria que você já domina. Assuntos complexos forçam a mente a trabalhar mais. “Quanto mais difícil, mais você terá que se concentrar e, assim, seu cérebro permitirá menos brechas para a distração”.
4) Faça do estudo um jogo
Criar um esquema de “auto premiação” pode ser o empurrãozinho que faltava para continuar motivado. Venceu um tópico daquela doutrina complicada? Gabaritou a lista de exercícios? Ponto para você.
Estabeleça uma lista metas, e à medida que elas forem cumpridas, dê a si mesmo pequenos “presentes”, como pausas e momentos para estudar sua matéria preferida, por exemplo.
Depois
5) Anote o que tira a sua concentração
Conhecer o “inimigo” é o primeiro passo para superá-lo. Por isso, indica-se também um exercício de autoconhecimento. A ideia é verificar o que o tira do foco e criar suas próprias estratégias para não se deixar vencer pela distração.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

As diferenças entre voto em branco e voto nulo

Diante da proximidade das eleições 2014, uma das questões mais comuns do eleitor é: "qual é a diferença entre o voto em branco e o voto nulo?".

As diferenas entre voto em branco e voto nulo
Nas eleições de outubro próximo serão escolhidos pelo voto popular o presidente que comandará o país de 2015 a 2018 e também os deputados estaduais, deputados federais, senadores e o governador de cada Estado. No Distrito Federal, as eleições contemplam a escolha dos deputados distritais e do governador.
Diante da proximidade das eleições, uma das dúvidas mais comuns do eleitor é sobre como vai votar.
Apesar de o voto no Brasil ser obrigatório, o eleitor, de acordo com a legislação vigente, é livre para escolher o seu candidato ou não escolher candidato algum. Ou seja: o cidadão é obrigado a comparecer ao local de votação, ou a justificar sua ausência, mas pode optar por votar em branco ou anular o seu voto.
Mas qual é a diferença entre o voto em branco e o voto nulo?

Voto em branco

De acordo com o Glossário Eleitoral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o voto em branco é aquele em que o eleitor não manifesta preferência por nenhum dos candidatos. Antes do aparecimento da urna eletrônica, para votar em branco bastava não assinalar a cédula de votação, deixando-a em branco. Hoje em dia, para votar em branco é necessário que o eleitor pressione a tecla “branco” na urna e, em seguida, a tecla “confirma”.

Voto nulo

O TSE considera como voto nulo aquele em que o eleitor manifesta sua vontade de anular o voto. Para votar nulo, o eleitor precisa digitar um número de candidato inexistente, como por exemplo, “00”, e depois a tecla “confirma”.
Antigamente como o voto branco era considerado válido (isto é, era contabilizado e dado para o candidato vencedor), ele era tido como um voto de conformismo, na qual o eleitor se mostrava satisfeito com o candidato que vencesse as eleições, enquanto que o voto nulo (considerado inválido pela Justiça Eleitoral) era tido como um voto de protesto contra os candidatos ou contra a classe política em geral.
Atualmente, vigora no pleito eleitoral o princípio da maioria absoluta de votos válidos, conforme a Constituição Federal e a Lei das Eleicoes. Este princípio considera apenas os votos válidos, que são os votos nominais e os de legenda, para os cálculos eleitorais, desconsiderando os votos em branco e os nulos.
Como é possível notar, os votos nulos e brancos acabam constituindo apenas um direito de manifestação de descontentamento do eleitor, não tendo qualquer outra serventia para o pleito eleitoral, do ponto de vista das eleições majoritárias (eleições para presidente, governador e senador), em que o eleito é o candidato que obtiver a maioria simples (o maior número dos votos apurados) ou absoluta dos votos (mais da metade dos votos apurados, excluídos os votos em branco e os nulos).

Aplicação nas eleições proporcionais

Já no que diz respeito às eleições proporcionais, utilizadas para os cargos de deputado federal, deputado estadual e vereador, a situação muda e os votos nulos e brancos passam a interferir no resultado das eleições. É que para ser eleito a um desses cargos, o candidato precisa alcançar o quociente eleitoral, que é o índice que determina o número de vagas que cada partido vai ocupar no legislativo, obtido pela divisão do número de votos válidos (votos atribuídos aos candidatos ou à legenda) pelo de vagas a serem preenchidas. Desse modo, quanto maior for a quantidade de votos nulos e brancos, menor será o quociente eleitoral e mais fácil será para o candidato conquistar a vaga.
É por esse motivo que muitas vezes um candidato obtém menos votos que outros e é eleito, puxado pela votação expressiva de outro candidato do partido ou pelos votos da legenda.
Assim, ao decidir votar nulo ou em branco, é importante que o eleitor esteja consciente dessas implicações.
– o 1º turno das Eleições 2014 ocorre no dia 5 de outubro e o 2º turno no dia 26 de outubro de 2014.
– de acordo com o Código Eleitoral, o voto é facultativo a maiores de 70 anos, aos maiores de 16 e menores de 18 anos e aos analfabetos.
– a exigência de maioria absoluta ocorre nas eleições para presidente, governador e prefeito de município com mais de 200 mil eleitores. Quando o candidato com maior número de votos não alcança a maioria absoluta é realizado o segundo turno das eleições entre os dois candidatos mais votados.